Rasga-valsa

Um pé enorme
Desenhado a caneta de poeta
Esmaga carro a carro a cidade

Vinte e sete anos depois
A cidade sorri bicicletas
Ninguém lembra o salvador

Foi
Valsa de poeta
Que rasga asfalto

Ponteiro avesso

Meu relógio tem
Três ponteiros
O açúcar
O sol
E a paciência.

A dieta de tempo
É certeira
É pontual
Mas se me atrasam
Não cruza comigo.

Meu relógio se arrasta
Ao avesso.

Apesar do marasmo

por enquanto, e só
por enquanto
vou esperar

Bituco

cigarro não
é tudo
ou mais

Há vagos

o tempo é um hotel
cada segundo
cada quarto

Ópios

Acende
Puxa
Prende
Passa

Inicia
Digita
Envia
Passa

Ajoelha
Confessa
Ameniza
Passa

Elege
Arrepende
Esquece
Passa

Senta
Analiza
Paga
Passa

Fuma
Bebe
Dorme
Passa

Paga
Transa
Goza
Passa

Torce
Ganha
Perde
Passa

Jornal
Pecê
Tevê
Desgraça

Pílula
Família
Álcool
Ressaca

Talvez um dia acordes;
Resgata a sobra da juventude,
Prepara uma corda apertada
E pendura a tua angústia.

naLua

Lua na vinda
Deixa se mostrar
Refletindo pálida
O morrer de Sol

Lua na lida
Se ocupa a preamar
Faz das águas, cama
E do negro, lençol

Lua na ida
Se curva, sem dobrar
É tangente à cálida
Abóboda do céu

Lua na linda
Manhã a se acordar
Bocejando sua chama
Astral, ainda ao léu

Sobre homenagear através das banalidades


Eu não estou triste, mas sinto uma vontade forte de chorar. Descobri que a amizade me comove. A perda, a separação, a cerveja e o encontro. A carne, a pêra, a água; a lágrima. Ela está sendo o suco de uma imensa sensação de ser humano. Reconheci numa pá de filmes alguns amigos e algumas paixões que têm tornado a minha vida suportável. São os ombros dessas meninas e desses meninos que a suportam sem saber; mas eles talvez saibam. Em suma, o sumo dos meus dias são sangue e suor. As lágrimas, essas eu derrubo aqui comigo pelo prazer de compartilhar o sangue e o suor deles.


...


Gosto de tomar banho no escuro e de ficar nu sempre que possível. Gosto de ver a nudez de uma personalidade e de me constranger quando ela se desnuda para mim. Gosto da vergonha de beijar alguém e de me exibir quando penso algo diferente. Gosto dos meus amigos pensando comigo e de sentar no chão. Gosto de abraçar alguém que eu gosto e de receber um abraço inesperado. Gosto de me surpreender com pequenos atos e de flagrar alguma incoerência que passaria despercebida. Gosto de passar despercebido pelo corredor e da conversa com alguém que vê a luz ao invés da lâmpada. Gosto de luz, mas acho que vezenquando a escuridão faz bem pra pele.


...


Aquele que escreve é apaixonado por uma amiga. Essa amiga diz ser apaixonada por outro menino. Esse menino diz ser apaixonado por ela. Aquele que escreve sabe que é verdade e aparentemente é feliz por ela, assim, na superfície.

No fundo também.


...


Banalidades para Mariana Gama, Consegnato & Benjamin.

Poema livre


Gosto de pensar a linha dos meus dias a partir de um zero.

Gosto de pensar a linha dos meus dias a partir de um

Gosto de pensar a linha dos meus dias a partir

Gosto de pensar a linha dos meus dias

Gosto                   dos meus dias

Gosto                                          de um zero.

                            meus dias a partir

         pensar                       a partir de    zero.

          e              o   eu       a   r ir           .


Um esmero preguiçoso

Declaro aqui (e acolá) sepultada a minha boa ventura. Eu a tentei como menino, como jovem e como homem. Tentativas tantas eu tentei, que minhas aliterações já nem fazem mais sentido. E por fim, aqui nesse meio, inicio a mea culpa de não ter tentado outras tamanhas tentações. Quis amá-la e ela amou a outro. Talvez não quisera o bastante (pois qual é o sujeito?). Sim, mas se... Embora eu ache que... Caso eu tivesse... Na realidade, a garantida verdade de toda essa certeza é que eu preferi não saber de nada e sonhar apenas. Sonhar, ao menos. Quem não quisera não era ela, quem jamais quis fui eu. Optei por sentar meus bolsos na cadeira, fertilizar projeções de vida e escrever o quanto ela é, foi, era, fora, seria e será linda. E imperfeita.

É que, no final, não sei nem mais de quem eu estou falando, que não de mim mesmo. Poderia ser só sobre a minha sorte, ou poderia começar com um G.

Tal face

dado dá seis faces
eu demando sete
se tivesse tal face
haveria mais chance
de alçar outro lance
que nos me acerte
que a sorte verte
cambando o sete
na pintura em transe

pinto sete lances

que a chance verta
acerte e alcance
a transa da sorte
algo torto, algo forte
benventurado
na impensável chance
de acertar o
fim