Sempre que ganha voz, o homem
Costuma consumir o homem.
Tantos pares que se consomem
Pra emergir da multidão!
Pois tudo que eles produzem,
Todos eles que se produzem
Com tamanho ímpeto jovem,
É pra ganhar a multidão!
Queremos tanto o talento...
Ainda que eles o provem,
Afundam, fugazes que são.
E é montando o momento
Forjando a voz, que o jovem
Ganha a fugaz emersão.
Reflexão sobre o caminho da ideia
Não há ser pensante e autoconsciente sem um par.
Linguagem é ferramenta entre pares, e só entre pares. Percepção de significância é outra instância, talvez mais universal.
A percepção de significância seria a interpretação similar de um gesto, som ou imagem por dois receptores que não dividem a mesma constituição biológica e bagagem audiovisual/cultural. Dois seres diferentes. A interpretação se daria em processos de comando ou indicação, não permitindo o diálogo direto; ela funciona, como exemplo simplista e claro, na relação de domesticação de animais.
A linguagem, em nível concreto, é baseada no dualismo. Uma ideia só é compreendida qquando sua contraparte é conhecida. Conhecer, no caso, se dá por meio da experiência sensorial, sem capacidade de abstração de valores quantitativos ou qualitativos, apenas a medição por si só.
Em seu nível abstrato, a linguagem perde os parâmetros gerais de comparação. Os valores assumem aspectos de universalidade e imparidade. As contraposições abstratas são, na verdade, nuances de um mesmo conceito. Nossas capacidades sensoriais não agem em nível abstrato, salvo em interpretações errôneas. Transcender a sensação corresponde a aspirar à universalidade.
Talvez seja impossível a um humano compreender plenamente a universalidade. Talvez sejamos indignos. Talvez ela não exista.
Linguagem é ferramenta entre pares, e só entre pares. Percepção de significância é outra instância, talvez mais universal.
A percepção de significância seria a interpretação similar de um gesto, som ou imagem por dois receptores que não dividem a mesma constituição biológica e bagagem audiovisual/cultural. Dois seres diferentes. A interpretação se daria em processos de comando ou indicação, não permitindo o diálogo direto; ela funciona, como exemplo simplista e claro, na relação de domesticação de animais.
A linguagem, em nível concreto, é baseada no dualismo. Uma ideia só é compreendida qquando sua contraparte é conhecida. Conhecer, no caso, se dá por meio da experiência sensorial, sem capacidade de abstração de valores quantitativos ou qualitativos, apenas a medição por si só.
Em seu nível abstrato, a linguagem perde os parâmetros gerais de comparação. Os valores assumem aspectos de universalidade e imparidade. As contraposições abstratas são, na verdade, nuances de um mesmo conceito. Nossas capacidades sensoriais não agem em nível abstrato, salvo em interpretações errôneas. Transcender a sensação corresponde a aspirar à universalidade.
Talvez seja impossível a um humano compreender plenamente a universalidade. Talvez sejamos indignos. Talvez ela não exista.
Desconfessado
Um grande problema na sua beleza é a agressividade. Veja bem, não estou a falar de sua postura; seu corpo respeita qualquer percepção de perfeição. Sua atitude, aparentemente contida ou simplesmente reservada, também não consegue chegar nem perto de um comportamento alterado. Chega a ser engraçado imaginar algo assim, talvez seria parecido com um filhote de tigre aspirando ser tão terrível quanto sua contraparte adulta.
Então o que me intimida em sua beleza? Mais do que isso, é necessário dizer, ela me causa pavor. As presas expostas, o olhar ferino à espera... Beleza predadora. Sim, é essa sensação de ser caçado que me arrepia e me contrai todos os músculos do corpo - e me estimula. Minha predadora involuntária é agressiva sem nem ao menos esboçar esforço, fazendo minha adrenalina subir com um suspiro apenas. Ela me faz estar sempre em estado de alerta, apreensivo, ansioso. Na verdade, é uma perseguição cansativa; a presa em constante busca por sua cruel caçadora, cena irreal e honesta...
Tudo isso é uma grande besteira. Sou eu tentando canalizar minha frustração e minha covardia em uma imagem que não representa nada. Talvez hoje eu me levante e fale; amanhã eu posso ainda estar reunindo coragem. A única gota de honestidade nesta confissão é o meu pavor.
Então o que me intimida em sua beleza? Mais do que isso, é necessário dizer, ela me causa pavor. As presas expostas, o olhar ferino à espera... Beleza predadora. Sim, é essa sensação de ser caçado que me arrepia e me contrai todos os músculos do corpo - e me estimula. Minha predadora involuntária é agressiva sem nem ao menos esboçar esforço, fazendo minha adrenalina subir com um suspiro apenas. Ela me faz estar sempre em estado de alerta, apreensivo, ansioso. Na verdade, é uma perseguição cansativa; a presa em constante busca por sua cruel caçadora, cena irreal e honesta...
Tudo isso é uma grande besteira. Sou eu tentando canalizar minha frustração e minha covardia em uma imagem que não representa nada. Talvez hoje eu me levante e fale; amanhã eu posso ainda estar reunindo coragem. A única gota de honestidade nesta confissão é o meu pavor.
Contos de almoço
Como era bom o cheiro exalado pelo feijão, feito carinhosamente pela avó! Aquele odor era uma experiência multifacetada, sinestésica, que levava às narinas figuras deliciantes e toques macios representados pelo sabor e o som do feijão. Chegava até a causar uma leve confusão na cabeça fresca e faminta do infante, que brincava distraído na sala da casa com seus blocos de montar. Ele passava a imaginar cenas inteiras baseadas somente naquele cheiro, e como ele era bom! Banquetes medievais a luz de velas e com bardos tocando seus alaúdes, bobos tendo seus ossos quebrados e a corte fazendo o que uma corte fazia... Ou quem sabe, depois de assistir a tantos desenhos na manhã, fosse uma mesa de jantar colonial, em um sítio folclórico no interior do Rio de Janeiro, com uma figura matriarcal, roupas caipiras e muitos animais ao redor da casa. Animais e monstros, o que inevitavelmente incidia em uma refeição nipônica. Alheia aos répteis atômicos e aos alienígenas invasores, a família se serve, em suas cumbucas lindamente pintadas, de algas cruas, peixes crus, vegetais crus e litros de saquê para catalisar a digestão. Tantas cenas passando por sua cabeça deixavam o garoto ainda mais faminto ao se sentar à mesa, e o sinal de ataque dado pela avó o liberava para uma luta injusta e calmamente travada contra o prato de feijão preto. Seu cheiro se espalhava por todo o quintal da casa. As árvores pareciam poder sintetizá-lo e converter em energia para si o que antes era material de construção para mundos imaginários. O menino acabava sempre por dar um cochilo após o almoço; sonhava com dinossauros e cavaleiros.
Fé na corda bamba
Os dedos na ponta de cada pé
Permitem que meu passo saia reto
Equilibrando-me no corpo ereto
Mas os dedos não me resguardam da frustração
E o que empurra o corpo (não fisicamente, mas do lado de dentro)
Ignora aqueles dedos, fazendo-me curvar, perco o centro.
A minha ventura é falha,
Mas brindemos a ela para encorajar:
Boa fortuna à minha ventura,
Que a cura da sorte é andar.
Permitem que meu passo saia reto
Equilibrando-me no corpo ereto
Mas os dedos não me resguardam da frustração
E o que empurra o corpo (não fisicamente, mas do lado de dentro)
Ignora aqueles dedos, fazendo-me curvar, perco o centro.
A minha ventura é falha,
Mas brindemos a ela para encorajar:
Boa fortuna à minha ventura,
Que a cura da sorte é andar.
De autoria conjunta de Arthur Rivelo e Rafael Spínola.
Um poema
Ele começa com um amigo
E uma manhã cinzenta de domingo
Na janela, nada mais que um pingo
Quando um fantasma cruzou comigo
Escuto a orquestra do frio
Eu fumo, eu faço fumaça
Eu sou o fantasma em mim
Da morte, matriz; morreu-me a massa
O tempo passa?
O tempo é frio, mas me assa
Me cozinha,
Me enlaça
E enquanto o nada me abraça
Simplesmente esqueço os meios
Absorto em uma visão branca
Me esqueço, me perco, me fluo
Mas que desgraça!
Nunca na vida senti tanto frio
O vidro, meus suspiros embaça
E eu torcendo pra não acabar no vazio
E quando finalmente faço sentido
Sol, céu e mar se invertem
Acabando com o meu abrigo
E no meu mundo se metem
Gelado trio
Amo, da tortura, o frio!
Forte tempo, com força eu torço
Para que, em um tempo largo
Quando eu for mais moço
Seja desse roto rebanho o mago
Que agite do gado o osso
Sol, céu e mar: magros como o tempo
Mar, céu e sol na ponte sobre um rio
Caudaloso com seu vento frio
Gelado trio
Amo, da tortura, o frio!
E uma manhã cinzenta de domingo
Na janela, nada mais que um pingo
Quando um fantasma cruzou comigo
Escuto a orquestra do frio
Eu fumo, eu faço fumaça
Eu sou o fantasma em mim
Da morte, matriz; morreu-me a massa
O tempo passa?
O tempo é frio, mas me assa
Me cozinha,
Me enlaça
E enquanto o nada me abraça
Simplesmente esqueço os meios
Absorto em uma visão branca
Me esqueço, me perco, me fluo
Mas que desgraça!
Nunca na vida senti tanto frio
O vidro, meus suspiros embaça
E eu torcendo pra não acabar no vazio
E quando finalmente faço sentido
Sol, céu e mar se invertem
Acabando com o meu abrigo
E no meu mundo se metem
Gelado trio
Amo, da tortura, o frio!
Forte tempo, com força eu torço
Para que, em um tempo largo
Quando eu for mais moço
Seja desse roto rebanho o mago
Que agite do gado o osso
Sol, céu e mar: magros como o tempo
Mar, céu e sol na ponte sobre um rio
Caudaloso com seu vento frio
Gelado trio
Amo, da tortura, o frio!
De autoria conjunta de Arthur Rivelo, Fernanda Prestes, Fernanda Novaes, Gabriel Menezes, Júlia Kastrup, Leonardo Fiuza e Rafael Spínola.
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